18.2.06
IMAGENS DO EXÍLIO: ABANDONO
O que há de tão encantador no sofrimento? Por quê é tão fácil acorrentar-se a palavras invisíveis? Dia após dia, mesmo com a consciência esclarecida, sou incapaz de livrar-me destes laços. Ao contrário, sinto que cada vez afundo mais numa tristeza pantanosa, lúgubre e soturna. Não há sol radiante de verão ou riso alegre e inocente de criança que me faça renunciar ao sofrimento. Em tudo há sombra: tenho olhos obscuros. É como se não houvesse ar fora de mim. E, no entanto, nada justifica esta tristeza: apenas egoísmo de menina.
Um filete de razão conduz-me à realidade. As coisas como são, não como as vejo. Que importo eu, no meio de outros tantos? Não é digno o cuidado que dispenso ao meu delírio. Não é justa esta dor, no fim, para comigo. Capricho, importância exagerada. Falta de altivez, nobreza e hombridade.
Ainda que às mulheres se permitissem veleidades, por que eu aceitaria a complacência alheia? Não sou Márcia ou Hélvia para que me escrevam cartas de consolo. A insignificância do meu mal é o que o perverte e só a mim cabe sublimá-lo.
O espírito, assim, na dor forjado, será capaz do justo sacrifício. Retomarei minha honra e meu orgulho calcando sob os pés o inútil sofrimento. A este fecho os olhos, vedo o peito. Que nem mais um instante me roube a tola fantasia. Transfigure-se meu rosto em pedra firme, estável sob toda circunstância. Embora sangre-me a alma sob a rocha, que apenas eu tenha ciência desta falha. A indiferença exterior a secará, para que reste apenas a emoção abnegada.
Júlia Petrosi (a quem agradeço sinceramentre pela permissão de publicar este texto)
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oi. Andei pesquisando blogues que falassem de Candomblé e encontrei o seu. Sou da Associação Portuguesa de Cultura Afro-Brasileira, espero a sua visita.
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